Mulheres com Deficiência pela Inclusão Já!

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quarta-feira, 28 de junho de 2017

BOTECO DA DIVERSIDADE: SEXUALIDADE E DEFICIÊNCIA - Capítulo 2

Queridas e queridos, segue o segundo capítulo do texto da Ana Rita de Paula sobre Sexualidade e Deficiência. 

Continuem acompanhando suas ótimas reflexões, comentem e compartilhem! 

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Diversidade corporal
Ana Rita - 2016
Nós somos o nosso corpo.
O meu corpo sou eu.
Você me vê porque habito um corpo.
Eu me relaciono com você e com o mundo através do meu corpo.
Se temos direito à diversidade, temos direito de nos expressar através de nossos diferentes corpos.
Ao meu corpo não falta nada,
Não quero retirar nada do meu corpo.
Sou reconhecida, aprovada ou não, pelo meu corpo.
Meu corpo guarda a memória de momentos felizes e encontros não tão felizes.
Meu corpo guarda a nostalgia do que desejo e não posso alcançar.
Meu corpo comemora tudo que consegui atingir.
Meu corpo é sábio e burro ao mesmo tempo.
Eu e meu corpo não queremos e não podemos ser autossuficientes.
Meu corpo pede e anseia pelo seu toque.
Meu corpo teme o seu não e sua agressão.
Nossos corpos foram considerados máquinas, naturalmente ajustadas como relógios.
Descobriram o fluxo do sangue e o funcionamento orgânico dos nossos corpos.
Hoje, nossos corpos são integrados e integram partes mecânicas e eletrônicas.
Nossos corpos, hoje, rompem a barreira do humano e do cibernético,
Experimentando uma nova estética.
No entanto, é mais do que necessário, hoje, adotarmos uma nova ética
Para nos relacionarmos com nossos corpos e com o corpo do Outro.
Essa ética deve buscar algo para além da perfeição e da eugenia.
Essa ética deve buscar reconhecer e valorizar a beleza que reside na diversidade.
Vivemos na pós-modernidade.
Estamos abandonando regras fixas, parâmetros indiscutíveis e teorias que desejam explicar tudo.
Estamos perdendo um chão falsamente construído e nos lançando em incógnitas infinitas.
Assim, é natural e desejável que abandonemos a ideia do Homem Vitruviano,
Do ideal do homem proporcionalmente construído e controlado.
Há diversos corpos buscando reconhecimento,
Há diversos corpos buscando dignidade,
Há diversos corpos buscando o direito ao prazer.
A energia poderosa da vida, também chamada sexualidade,
Possui a capacidade de romper barreiras, de proporcionar encontros inusitados,
Gerar novos corpos que também tem o direito ao prazer e à diversão.
E o direito à diversexualidade!


Todos somos seres sexuais
A sexualidade é um fator essencial da natureza humana e não é possível diminuí-la, negá-la ou fazê-la desaparecer. Todos nós somos seres sexuais e, obviamente, as pessoas com deficiência também o são. Entretanto, há apenas alguns anos atrás, nem se admitia que essas pessoas tivessem necessidades e direitos a vivenciar e expressar sua sexualidade. Hoje é incontestável que todas as pessoas com deficiência têm o direito a uma vida afetiva e sexual plena.

A partir do movimento das pessoas com deficiência por seus direitos, ao longo das décadas de 1960 e 1980, a sexualidade da pessoa com deficiência começa a ser discutida. O interesse por esta questão inicia-se com a constatação de que a sexualidade é um direito inerente à condição humana, paralelamente a estudos sobre autoimagem. Todos esses estudos reconhecem que a sociedade crê haver somente duas alternativas possíveis: a deficiência acarretaria a impossibilidade do exercício da sexualidade ou a condição da deficiência não implicaria em nenhuma alteração na vida sexual.  

Ambas as colocações são falsas, pois uma nega a sexualidade e a outra, a deficiência, ignorando a articulação destes aspectos no que diz respeito à vivência individual e mesmo das consequências no plano social. No início dos anos 80, a sexualidade destas pessoas é abordada a partir de outras concepções, que não o de uma mera necessidade orgânica. A adolescência, o desempenho de papéis sexuais, a gravidez e o planejamento familiar para pessoas com deficiência, tornam-se temas de reflexão. Afirmam PAULA, REGEN E LOPES (2005, p.41):

“Estes estudos já revelam uma tendência, embora tênue, de elaborar uma análise mais psicossocial do que meramente orgânica e genital. No entanto, como o enfoque central é desenvolver técnicas de intervenção clínica e de aconselhamento visando ao ajustamento social, ainda persiste o viés de patologizar a sexualidade e a deficiência”.

O atendimento às pessoas com deficiência está se afastando de uma postura assistencialista e segregacionista, segundo GLAT (2007), voltando-se para uma abordagem sócio educacional, com ênfase na autonomia e inclusão social. A consideração dos direitos sexuais e reprodutivos como Direitos Humanos, a partir de 1994, reforçou a tendência de uma compreensão mais ampla deste campo, estendendo esses direitos para as pessoas com deficiência.

A preocupação crescente com a humanização dos serviços de saúde vem ao encontro da garantia desses direitos. Podemos entender humanização como a capacidade, tanto dos profissionais de saúde como dos usuários do SUS, de estabelecerem um encontro ético, no qual o diálogo, ou seja, a capacidade de ouvir empaticamente o outro esteja presente.

No caso das demandas relacionadas à sexualidade ou às questões de gênero, ouvir empaticamente o usuário do Sistema de Saúde implica em desenvolver um olhar destituído de preconceitos. Muitas vezes, por exemplo, a ideia de incompatibilidade entre desejo sexual e deficiência física, pode se antepor a escuta da fala do outro.

Um episódio ocorrido com uma mulher com deficiência exemplifica esta situação. Em uma consulta com um médico de família, uma mulher com deficiência solicita a realização do exame Papanicolau e lhe é dito que, em seu caso, não é necessário realizar o exame porque a incidência de câncer de colo de útero está ligada à vida sexual ativa. A suposição de que aquela usuária, em função da deficiência, não tinha vida sexual, impediu o profissional de reconhece-la como mulher e, mesmo, como pessoa.

No intuito de responder a demanda de definição de diretrizes e orientação aos profissionais do SUS, o Ministério da Saúde realizou diversos encontros e seminários, culminando com a publicação do documento “Direitos Sexuais e Reprodutivos na Integralidade da Atenção à Saúde de Pessoas com Deficiência” em 2009, contendo recomendações para os gestores do SUS operacionalizarem as ações propostas pela Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência neste campo.

Outros documentos nacionais e internacionais foram surgindo ao longo do tempo, reafirmando este tema como pertencente ao campo dos direitos humanos. A Convenção da ONU, sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Governo brasileiro em 2008, além de  reiterar a necessidade do reconhecimento da importância de abordar o tema “sexualidade” nos seus múltiplos aspectos: direito ao exercício da sexualidade com segurança, dignidade e direito à reprodução, prevenção e promoção da saúde e a urgência de ações de prevenção contra a violência e abuso sexual, diagnóstico e tratamento das DST/aids que contemplem as especificidades da pessoa com deficiência, explicita a situação de maior vulnerabilidade e de desrespeito para com os  direitos humanos, sociais, econômicos e políticos  das  crianças e particularmente das mulheres com deficiência.

A mais recente legislação no campo da deficiência no Brasil é a Lei Brasileira de Inclusão - LBI (2016) e, este instrumento legal também trata de aspectos importantes para a garantia dos direitos sexuais e reprodutivos das pessoas com deficiência, impedindo, por exemplo, que mulheres com deficiência sofram qualquer procedimento médico ou cirúrgico sem seu consentimento com o intuito de restringir ou impossibilitar a gestação.


Tanto a Convenção como a LBI são a tradução do pensamento mais atual na área da defesa dos direitos das pessoas com deficiência, a tal ponto que convido você, leitor, a dar pelo menos uma olhadinha nestes documentos. Mas, se você estiver envolvido com a questão da deficiência, quer pessoalmente, quer profissionalmente, trata-se de uma leitura obrigatória.

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O primeiro capítulo deste artigo está no link: 

https://coletivomulheresinclusao.blogspot.com.br/2017/06/boteco-da-diversidade-sexualidade-e.html

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