Mulheres com Deficiência pela Inclusão Já!

Mulheres com Deficiência pela Inclusão Já!

terça-feira, 11 de julho de 2017

ONU Mulheres com deficiência



ONU Mulheres: Ampliando a voz das mulheres com deficiência

Na 10ª sessão da Conferência dos Estados Partes à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), realizada nos dias 3 a 15 de junho, a ONU Mulheres contribuiu para ampliar a voz das mulheres com deficiência e destacar a importância da representação delas na tomada de decisões. 
A ONU Mulheres co-patrocinou e participou em diversos eventos paralelos. No diálogo interativo entre os Estados Partes (à CDPD) e as Nações Unidas, a ONU Mulheres apresentou suas iniciativas em apoio à implementação da CDPD. Para saber mais sobre a voz das mulheres, acessem:



ONU Mulheres: Voz de mulheres líderes com deficiência

Casar Jacobson - uma ativista de direitos de pessoas com deficiência e Campeã Jovem da ONU Mulheres - partilha sua história de vida como pessoa com surdez que conquistou um lugar no mundo do trabalho. Ela enfatiza o poder da tecnologia para garantir que ninguém será deixado para trás. Confiram mais sobre ela no link: 

Para Pratima Gurung, do Nepal, o empoderamento de mulheres indígenas com deficiência começa com o reconhecimento delas como participantes ativas e tomadoras de decisões. Ela aponta para a necessidade de fortalecer a voz das mulheres em fóruns sobre deficiência. Para saber mais, acessem o link: 



segunda-feira, 3 de julho de 2017

BOTECO DA DIVERSIDADE: SEXUALIDADE E DEFICIÊNCIA - Último capítulo


Queridas e queridos, segue o quinto e último capítulo do artigo de Ana Rita de Paula sobre "Sexualidade e Deficiência" publicado no Boteco da Diversidade, evento realizado no SESC Pompéia em SP.

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Gênero e Deficiência

A discriminação das mulheres em geral, e das mais pobres, em particular é notória. Em nosso país, a expectativa de vida das mulheres é maior, mas isto não significa melhor qualidade de vida. Na maioria das vezes, ocorre um processo de envelhecimento repleto de dificuldades, discriminações e preconceitos. Conforme consta no Plano Nacional de Políticas para as Mulheres:

“ o aumento das separações, seja por divórcios ou morte dos maridos, legam às mulheres vidas sem rendimentos para aquelas que foram apenas donas de casa ou responsabilidades pelo sustento da casa em função de sua aposentadoria. Umas são vulneráveis na velhice porque sempre foram dependentes dos maridos, enquanto outras o são devido a deficiências oriundas do processo de envelhecimento. As mulheres com deficiências, jovens ou idosas, enfrentam desafios maiores, com preconceitos e estereótipos, histórias de exclusão e violências que limitam suas vidas, dificultando o acesso ao mercado de trabalho, à saúde e à educação. Para uma efetiva mudança dessa realidade, elas devem ser inseridas no processo democrático, na vida cotidiana, no trabalho, na educação, nos mais variados serviços e equipamentos públicos. A perspectiva de acessibilidade para as mulheres com deficiência é uma das metas perseguidas pelas políticas. Estas políticas devem garantir segurança e autonomia, para que as mulheres com deficiência sejam inseridas em todas as esferas da vida pública e privada, sem serem alijadas de seus direitos e cidadania”.

A pessoa com deficiência, independente de gênero, por causa de uma história de marginalização, experimenta situações frequentes e variadas de desvantagens pessoais, grupais e sociais, tais como baixa autoestima, rejeição familiar e grupal, baixa escolaridade, desinformação em geral, desemprego ou subemprego, consolidando um ciclo de exclusão social.

Luciana Steffen localiza no tempo os Estudos sobre Deficiência, afirmando que estes:

surgiram entre os anos 1970 e 1980, a partir das lutas políticas das pessoas com deficiência, por vida independente, reivindicando seus direitos e tendo como principal eixo o modelo social da deficiência. Os Estudos sobre Deficiência começaram a se articular com os Estudos Feministas e com a categoria de gênero na década de 90, podendo um se beneficiar do outro. Tanto as teorias feministas/de gênero quanto os Estudos sobre Deficiência consideram a desigualdade imoral e lutam contra a opressão. Ambos os estudos denunciam a desigualdade, a discriminação e a opressão socialmente criada pelo corpo (sexo/lesão)”.

No Brasil, as mulheres com deficiência recebem um salário menor que as mulheres sem deficiência e que os homens com ou sem deficiência, e se encontram menos empregadas que os homens com deficiência. Segundo o IBGE, 60,3% dos homens com algum tipo de deficiência trabalham, enquanto apenas 41,7% das mulheres com deficiência trabalham, mesmo havendo mais mulheres com deficiência, afirma Steffen.

Outro aspecto na relação entre condição feminina e deficiência é o fato que a deficiência dificulta o processo de identificação das mulheres com seus pares sem deficiência. A deficiência e a condição feminina possuem representações sociais em comum que se intensificam mutuamente, como as questões de passividade, de carência e de dependência. Por outro lado, mulheres com deficiência estão distantes, sob a perspectiva da sociedade, dos papéis atribuídos às demais mulheres.
Steffen ainda afirma:

“As expectativas culturais das mulheres são: cuidar da casa, ser mãe, esposa e parceira sexual, e atualmente, trabalhadora, além de enfermeira, secretária, entre outros. Essas expectativas estereotipadas podem ser difíceis de alcançar para algumas mulheres com deficiência”. (...)

“Assim, as mulheres com deficiência se relacionam mais com homens com deficiência, e o número de divórcios é muito mais alto para mulheres que adquirem uma deficiência depois do casamento, do que para homens que adquirem uma deficiência depois do casamento”. (...)
Os tipos mais comuns de violência contra mulher com deficiência podem ser classificados como: negligência ou descuido; abuso físico; abuso psicológico; abuso sexual e exploração econômica”.

Inúmeros estudos comprovam que meninas e mulheres com deficiência são ainda mais vulneráveis, especialmente no que diz respeito à sexualidade.

Os resultados de um relatório recente do Banco Mundial/ Faculdade de Yale sobre HIV/AIDS e Deficiência (2006) chamam a atenção para a extrema vulnerabilidade das pessoas com deficiência nessa área. Estima-se que mulheres com deficiência correm três vezes mais o risco de serem estupradas do que mulheres sem deficiência. Outro dado indica que chega até a 70% os casos de abuso sexual de jovens com deficiência intelectual. A inexistência de programas de saúde sexual voltados para estas pessoas agrava esta situação de vulnerabilidade.

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, em seu artigo 6, sobre Mulheres, afirma que:

  1. Os Estados Partes reconhecem que as mulheres e meninas com deficiência estão sujeitas a múltiplas formas de discriminação e, portanto, tomarão medidas para assegurar às mulheres e meninas com deficiência o pleno e igual exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. 

  2. Os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas para assegurar o pleno desenvolvimento, o avanço e o empoderamento das mulheres, a fim de garantir-lhes o exercício e o gozo dos direitos humanos e liberdades fundamentais estabelecidos na presente Convenção”. 

Entretanto, nem sempre a sobreposição de duas condições sociais como a de deficiência e a de mulher implicam no aprofundamento da discriminação e do preconceito.

Qualquer fenômeno humano é extremamente complexo, contendo aspectos contraditórios intrinsicamente. Estamos tratando de um sujeito que é construído socialmente e possui uma dimensão histórica, além de ser também um sujeito psíquico que atua não somente de forma consciente e cuja expressão da sexualidade está na base da subjetividade e não se encontra sob seu total domínio e controle voluntário.  

Cada sujeito se constrói de forma peculiar no mundo e possui uma vivência específica da deficiência, do papel de homem ou mulher, da sexualidade e de seu entrelaçamento no âmbito da experiência do corpo próprio. Desse modo, ao mesmo tempo em que a condição feminina e a condição da deficiência são dimensões que impõem uma dupla discriminação e uma sobre exclusão social, a vivência de expressões do corpo feminino pode significar para o sujeito um caminho de reconstrução do corpo próprio como experiência de prazer, de pertencimento ao mundo, de capacidade pessoal e de autoestima superior.

O feminismo intersecional, uma visão recente de alguns movimentos feministas, parece-me muito interessante, porque ele transforma objetos de estudo em sujeitos complexos, fazendo a interseção entre classes sociais, etnia, orientações sexuais, transexualidade, dentre outros aspectos, capturando as consequências da interação entre duas ou mais formas de “assujeitamento” como o sexismo, racismo, patriarcalismo e capacitismo. Ao trazer a questão da transversalidade das condições sociais, esta perspectiva amplifica o feminismo que, muitas vezes, traz mais as demandas das mulheres brancas e burguesas. Ela ressignifica os feminismos e traz para o centro dos debates as diversidades.

Talvez a construção de uma ponte que aproxime as mulheres com deficiência de sua condição feminina, ainda que esta signifique muitas vezes o reconhecimento de que se está submetida a situações de injustiça social, pode possibilitar o resgate da emancipação do sujeito feminino.


Caro leitor, eu poderia continuar conversando sobre deficiência, sexualidade e sobre a interseção destes temas indefinidamente, caso houvesse ouvidos infinitos. Porém, espero ter alcançado meu objetivo: interessá-lo e cativá-lo para este assunto. Caso você tenha desejo de continuar lendo e se informando a respeito, existem vários sites e blogs na internet que poderão guiá-lo em um caminho de aprofundamento reflexivo. Gostaria que você o fizesse e desejo-lhe momentos de aprendizado prazeroso.

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Capítulo 3:

domingo, 2 de julho de 2017

BOTECO DA DIVERSIDADE: SEXUALIDADE E DEFICIÊNCIA - Capítulo 4


Queridas e queridos, segue o quarto capítulo do artigo de Ana Rita de Paula sobre "Sexualidade e Deficiência" publicado no Boteco da Diversidade, evento realizado no SESC Pompéia em SP.

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A mobilização e organização das pessoas com deficiência e a sexualidade

Há pelo menos 30 anos, os movimentos de pessoas com deficiência discutem a questão da sexualidade. Mas, no início, essas discussões eram tímidas e se focavam na capacidade, particularmente de homens com lesão medular, no desempenho sexual.

Esta restrição ocorria principalmente em função da concepção de corpo, de deficiência e de sexualidade dominantes. Estas concepções estavam e, ainda estão, marcadas por uma visão biológica e organicista, com o predomínio do modelo médico da deficiência.

O modelo médico reconhece na lesão, na doença ou na limitação do organismo, quer física, quer intelectual, quer sensorial, a causa primeira da desigualdade social e das desvantagens vivenciadas pelas pessoas que as possuem. Além de colocar em segundo plano e de forma complementar a questão social, considera o corpo apenas enquanto organismo biológico.

Esta visão nasceu em um momento histórico no qual a ciência tornava-se explicação dominante do mundo, retirando o poder das causas atribuídas à vontade de Deus. Isto ocorreu no início da Idade Moderna, com o surgimento do humanismo, doutrina que colocava o homem como centro do universo e o mundo natural como o único campo de explicação dos fenômenos e dos problemas humanos.

Assim, a deficiência deixava de ser vista a partir de argumentações metafísicas e passava a ser considerada como consequência de doenças e/ou acidentes, passíveis de prevenção e tratamento médico. Mais tarde, surgem as propostas de intervenção de educação especial, visando a estimular o desenvolvimento das pessoas que nascessem com limitações, principalmente, intelectuais e sensoriais.

O corpo, a partir da Modernidade, começa a ser considerado como semelhante a uma máquina, na qual as peças se encaixam e produzem movimento. Posterior à visão do corpo-máquina, surge a ideia do corpo-organismo, um conjunto de órgãos que interagem, de modo sistêmico, internamente e com os estímulos do ambiente externo, propiciando as funções básicas da vida. A sexualidade, nesta concepção, é entendida como função e como comportamento do organismo, sendo ambos vistos unicamente como dimensões da biologia e da natureza.

Desta forma, por se tratar de um organismo “danificado”, a dimensão sexual do corpo deficiente é encarada como inexistente, no caso das deficiências físicas e sensoriais, ou exacerbada, no caso de uma mente “sem razão” e competência para controlar os impulsos da carne, como ocorreria hipoteticamente na deficiência intelectual.

Portanto, a questão da articulação entre deficiência e sexualidade fica restrita a estudos sobre as possibilidades ou não de organismos com deficiência desempenharem o ato sexual de modo considerado normal e/ou satisfatório. Os aspectos emocionais e sociais são encarados como decorrência dos fatores biológicos. Consequentemente, a maioria dos estudos se centrava nas possibilidades e nas alternativas para o desempenho sexual de homens com lesão medular, uma vez que, como já dissemos, é o único quadro de deficiência que pode afetar a ereção masculina e a lubrificação genital feminina.

Entretanto, não vamos nos iludir! O estudo de forma privilegiada da condição masculina de lesados medulares está preso a questões do privilégio do gênero masculino e a aspectos de classe social, uma vez que, as pessoas com lesão medular pertencem a classe média e classe média alta, na nossa sociedade.

A partir de meados do século XX ocorreram fatos que impactaram diretamente as noções sobre deficiência e sobre a prática sexual. Entre estes fatos, estão as duas guerras mundiais que produziram muitas pessoas com deficiência e os movimentos sociais de luta pelos direitos civis, pelos direitos dos negros que, juntamente com o movimento hippie e a organização feminista afrouxaram a moral e permitiram a dissociação entre sexo e procriação.

No bojo de todas essas transformações, cresceu a organização das pessoas com deficiência e disseminou-se o modelo social da deficiência que insere este tema no campo dos direitos humanos.
Segundo a antropóloga brasileira, Débora Diniz, no modelo social:

“(...) deficiência não é mais uma simples expressão de uma lesão que impõe restrições à participação social de uma pessoa. Deficiência é um conceito complexo que reconhece o corpo com lesão, mas que também denuncia a estrutura social que oprime a pessoa deficiente. Assim como outras formas de opressão pelo corpo, como o sexismo ou o racismo, os estudos sobre deficiência descortinaram uma das ideologias mais opressoras de nossa vida social: a que humilha e segrega o corpo deficiente”. (DINIZ, D. O que é deficiência)

A partir desta nova forma de encarar a deficiência como um fenômeno multidimensional seus aspectos sociais políticos e históricos ganharam espaço, tanto na academia, como, nas discussões do movimento social.

Só, mais recentemente, este movimento social começou a discutir sexualidade das pessoas com deficiência, sem as sutilezas de uma linguagem encobridora do caráter carnal do sexo, também aplicado ao caso destas pessoas. Não se trata de discutir sexo de anjos, nem tampouco de proclamar o sexo como meramente um direito. Trata-se de desnudar o fato de que as pessoas com deficiência fazem sexo e o fazem vivendo o prazer de infinitas maneiras, apesar das dificuldades sociais de serem escolhidos como parceiros, no jogo do sexo.

Em Barcelona nasceu um slogan acompanhado de uma campanha pelo reconhecimento de que as pessoas com deficiência, ou melhor dizendo, como eles nomeiam, pessoas com diversidade funcional, são seres sexuais. Yes, we fuck pretende discutir a vida sexual das pessoas com deficiência, de modo explícito, franco e sem subterfúgios.

Nós, no Brasil, estamos formando um coletivo em articulação com o movimento europeu. Se você quiser participar das discussões ou simplesmente conhecer melhor essa proposta, acesse o grupo Yes, we fuck.br no Facebook.

Tempo de inclusão

Entre as principais conquistas do movimento reivindicatório das pessoas com deficiência está o reconhecimento, por parte da sociedade, de que estas pessoas são os legítimos interlocutores para o diálogo e a discussão acerca de suas necessidades e para a definição de prioridades e de políticas públicas a serem adotadas neste campo. Isto fez com que antigos “representantes” das pessoas com deficiência, como os médicos e demais profissionais de reabilitação, além dos familiares, fossem substituídos pelos líderes do movimento. Outra conquista fundamental foi o estabelecimento do princípio de inclusão social.

Dentro deste princípio, não é mais a pessoa com deficiência que deve se ajustar à sociedade, tal como ela está, e sim, é a sociedade que deve adaptar-se e prover todos os meios necessários para atender as necessidades de toda e qualquer pessoa, incluindo as pessoas com deficiência. A partir do modelo de sociedade inclusiva, todos os sistemas sociais têm que reconhecer o valor da diversidade humana e criar condições para atender a todos, considerando suas diferentes necessidades.

À vista disto, a sexualidade das pessoas com deficiência passa a ser encarada dentro de uma abordagem psicossocial, com ênfase na vida sexual satisfatória, com afeto e autonomia.

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Capítulo 3: